MEDIAÇÃO ESCOLAR NA PRÁTICA

A idéia desse relato surgiu para esclarecer o papel do mediador escolar devido à demanda de pais e profissionais da área da saúde e educação que buscam incluir seus filhos e clientes nas escolas regulares. Após consultar a literatura existente sobre inclusão escolar, deparei-me com a carência de informações sobre como incluir efetivamente, e a partir de então, achei por bem relatar minha prática profissional nesta área de mediação escolar de crianças com Transtorno do Espectro do Autismo.

Antes de tudo, busquei saber o significado da palavra inclusão para poder praticá-la. Pude perceber que para inserir, abranger, envolver necessita de alguém que o faça.

E quem é esse alguém?

No âmbito escolar, a inclusão de crianças que apresentam necessidades educacionais especiais, no caso em questão o autismo infantil, é realizada por um profissional da área de saúde ou educação (Fonoaudiólogos, Psicólogos ou Pedagogos) que possuem o conhecimento sobre o desenvolvimento infantil em sua totalidade. Atualmente esse profissional é conhecido como Mediador Escolar. Como o próprio nome indica, esse profissional media e intervém nas situações sociais, comportamentais, linguísticas, cognitivas, pedagógicas e lúdicas que ocorrem dentro da rede de ensino regular a qual a criança está inserida.

Incluir não é apenas inserir a criança no grupo. A criança que apresenta necessidade educacional especial não basta estar ao lado de outras crianças com um desenvolvimento típico para que se possa dizer que está sendo incluída. Incluir requer conhecimento teórico sobre a especificidade daquele indivíduo e acima de tudo muito amor, dedicação, paciência, persistência e bom senso dos que tentam por em prática essa inclusão. Uma inclusão efetiva depende muito de adaptações e de condições necessárias para favorecer o desenvolvimento e a aprendizagem do indivíduo.

A legislação brasileira garante o direito das pessoas com necessidades especiais receberem educação preferencialmente na rede regular de ensino, porém muitos professores e as próprias instituições não estão preparados para assumir tal responsabilidade. Alguns questionamentos surgem sobre o que fazer diante de um aluno com uma determinada dificuldade, inabilidade ou até mesmo com um desenvolvimento atípico, “diferente” do grupo.

Diante do processo de inclusão escolar, o educador que atua na rede regular de ensino e rege uma turma onde há algum aluno com necessidade educacional especial, se depara com um desafio e passa a se questionar se conseguirá ministrar suas aulas e educar a todos com um ensino de qualidade dentro da proposta pedagógica estipulada pela instituição. Muitas vezes aquele aluno em questão, sem o devido suporte, acaba não recebendo atenção necessária por conta do educador não saber lidar em determinadas situações. Quando o educador não consegue dar o devido apoio ao aluno que requer uma atenção especializada e diferenciada, o Mediador Escolar é solicitado, dando o suporte necessário a esse aluno, mediando à aprendizagem e facilitando a inclusão no grupo através de estratégias e intervenções imediatas, dirigidas e diárias que favorecem o desenvolvimento da criança.

Os progressos não dependem da espontaneidade da criança por si só e sim do trabalho constante e integrado de todos os profissionais envolvidos na singularidade daquele indivíduo, associado ao importante apoio e dedicação da família. No final, tudo se torna uma saudosa lembrança de que lutar vale a pena e que a vitória só é conseguida com a ajuda de todos.

Alguns desafios que me deparei na prática da inclusão:

Relatarei alguns desafios que observei na minha atuação como mediadora desde 2004 nas escolas regulares particulares do Rio do Janeiro. A lei garante o direito das crianças portadoras de necessidades especiais a frequentarem escolas regulares, mas as instituições de ensino muitas das vezes não possuem profissionais capacitados para executar a inclusão, ocorrendo uma pseudoinclusão. A falta de conhecimento e de interesse em buscar saber sobre o diagnóstico e a desorganização da rotina escolar foram meus grandes desafios. O mais difícil não era lidar com a inclusão da criança no grupo propriamente dita e sim com os leigos que não entendiam minha função e acabavam interferindo no processo.

Inúmeras vezes expliquei o papel do mediador, mas ouvia dizer que não poderia mudar toda a estrutura de uma escola por causa de uma criança. Lembro-me de uma coordenadora pedagógica dizendo que tinha muitos anos de prática escolar e que eu não poderia modificar uma estrutura concretizada e cristalizada. Muitos questionamentos dos professores sobre o que eu fazia com aquela criança em uma escola regular e se não seria melhor eu estar em uma escola especial. Questionavam minhas insistências para que a criança interagisse e “acordasse para o mundo e saísse da concha”. Insistiam em dizer que a criança não queria cumprir a rotina escolar, que eu “sufocava” a criança e que era para deixá-la “respirar”. Se fosse para deixá-la livre, como muitas pessoas me pediam para fazer, ela não precisaria de mediação, poderia ficar sem direcionamento dentro de sala de aula olhando para o teto ou passando os objetos na altura dos olhos, ou até mesmo dormindo no canto da sala para não “atrapalhar” a aula.

A inclusão de crianças autistas requer um cuidado enorme para quem quer obter evolução. O mediador precisa saber previamente o planejamento pedagógico para antecipar à criança o que vai acontecer no dia, adaptar atividades se houver necessidade e poder lançar mão de recursos que facilitem sua compreensão. A rotina escolar, as regras e os combinados devem ser claros e cumpridos diariamente, pois não adianta o mediador exigir que a criança sente no momento da atividade dirigida se mais da metade da turma está em pé, dentre outras inúmeras situações que dariam muitos parágrafos se eu pudesse descrevê-las.

Percebo em minha prática de inclusão, uma preocupação dos professores em divulgar o trabalho pedagógico para os pais e expor tudo que está sendo feito durante o ano, sem se importar de fato se a criança está aprendendo efetivamente. A falta de estratégias para abordar um assunto e favorecer o aprendizado é muito comum. Vejo uma pedagogia descontextualizada que poderia ser mais motivadora e interessante se fosse associada a atividades lúdicas de acordo com os interesses das crianças. Muitos pontos devem ser revistos na educação atual em relação aos conteúdos, ao ambiente, a postura do professor diante do grupo para que depois possa se pensar em inclusão. É muito desgastante incluir, não pela dificuldade do transtorno propriamente dito e sim pelo preconceito e pela dificuldade de aceitação do novo que está arraigado em nossa sociedade. O importante é plantar no coração das crianças a semente do amor para que um dia possamos transformar nossa sociedade em uma sociedade mais flexível e preocupada com o outro.

Vanessa de Freitas Schaffel
CRFa 11.167-RJ
Fonoaudióloga, Psicomotricista, Especialista em Educação Especial Inclusiva e Mediadora escolar com muito orgulho.

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